domingo, 18 de agosto de 2013
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Entendendo a desigualdade de gênero e o papel da mulher

06:15
Analisar o papel da mulher na sociedade contemporânea e seus desafios está além da própria contemporaneidade, esta analise abrange todo um contexto histórico e biológico do próprio ser humano e no caso do Brasil devemos ressaltar ainda a cultura derivada dos portugueses, índios e africanos.
O Brasil devido a sua grande heterogeneidade tornou-se um laboratório para a análise comportamental do ser humano, um país tão vasto em território e igualmente vasto em cultura merece olhos atentos ao papel da figura feminina.
Devido à colonização portuguesa o nosso país absorveu grande parte do regime patrilinear – regime dominantemente europeu em que a mulher é vista como dependente do homem. Essa herança européia levou a desvalorização da mulher e do seu papel na sociedade, sendo ela considerada um ser sem direitos e sem voz perante as escolhas coletivas (voto) e individuais (trabalhar sem autorização do marido).
Em contrapartida os africanos trazidos para o Brasil durante o período escravocrata – maioria Bantus (originados da Angola, República do Congo e Moçambique) e Oeste-africanos (originados da Nigéria, da Costa do Marfim, Benim, Tongo e Gana) – em algumas de suas culturas da Angola – bakongo, ovimbudo, kwanhamas – conservaram-se um regime matrilinear, onde a mulher tinha papel importante na construção e decisão dos rumos da sociedade contradizendo a cultura de algumas regiões da África onde se aplica até mesmo a mutilação genital feminina.
O papel feminino dominante nas comunidades indígenas brasileiras assemelha-se ao papel dado a mulher européia, destinando-as aos afazeres de casa, a perpetuação da família e especialmente de dar ao homem um varão que vá continuar o legado do pai nas atividades familiares.
Toda essa disparidade entre o papel e importância dada ao homem e a mulher nas diferentes sociedades deve-se a conseqüência do ambiente em que vivem os indivíduos, aos valores e regras que aquele ambiente junto aos seus componentes ditam e a disposição do individuo, seja genética ou não.
A própria Bíblia no livro de Gênesis aponta a superioridade masculina sobre a mulher quando alega que o homem foi o primeiro habitante da terra e na sua necessidade de uma companheira, Deus lhe fez a mulher da costela do homem. A disseminação da escritura (Jesuítas na catequização dos americanos) nos diversos povos e culturas levou a também disseminação da visão de supremacia masculina sobre a feminina. Quando posto a prova essa visão bíblica, deparamo-nos com um fato ironicamente interessante. Estudos mostram que o desenvolvimento de um ser do sexo masculino deve-se a produção de uma proteína pelo cromossomo Y logo após a sexta semana de gestação, caso essa produção não aconteça, um feto do sexo feminino será gerado automaticamente. O que levou a biologia moderna a crer que a geração de uma mulher é “o default do programa genético fetal” o que seria o homem sendo “gerado” da costela da mulher.

As diferenças biológicas entre os gêneros pode também ter sido um dos motivos da ideia de dominação do homem sobre a mulher, algumas das diferenças já apontadas em estudos não passam de estereótipos, outras são consistentes como a maior habilidade numérica e de visualização espacial dos homens e da maior fluidez verbal das mulheres, o que para alguns especialistas deve-se a influencia também cultural.  Mas estudos com outros primatas revelam que eles também têm preferências de acordo com o seu gênero, o que leva a crer que as diferenças entre homens e mulheres vão além da cultura e que a supremacia masculina encontrada em bandos de outros animais revela o mesmo. O que nos leva a pensar que as diferenças físicas – lembrando que essas diferenças são acusadas a partir de pesquisas (mulheres geralmente menores que os homens, mais leves, menor detenção de massa) levam ao equívoco do estereótipo de “sexo frágil” caracterizando a mulher ou fêmea quando analisamos os demais primatas. Esse mesmo estereótipo é quebrado quando analisamos algumas reações dos gêneros, por exemplo, a mulher tem maior tolerância à dor o que a torna mais tolerante as dores do parto e as demais dores causadas pela menstruação, o que nos leva a dizer que a mulher é um sexo nada frágil. E mesmo todas estas considerações científicas sobre os estereótipos dos gêneros também estão passíveis de exceções.
Irônico também é analisar a visão desvalorizadora dos filósofos gregos sobre a mulher, sendo que a própria democracia, – etimologicamente governo do povo- surgiu na Grécia em meio a pensamentos filosóficos. Este conceito de democracia dá ao cidadão o poder de escolha, mas a mulher não é vista como digna deste poder de escolha, já que não era considerada cidadã. Platão deixa clara a condição da mulher na Grécia antiga ao dizer “Se a natureza não tivesse criado as mulheres e os escravos teriam dado ao próprio tear a propriedade de fiar sozinho”, comparando a mulher a um escravo ou até menor que este.
Ainda no século XIX o movimento feminista surge buscando direitos equânimes principalmente quanto a política, a não generalização do papel do gênero na sociedade e proteção à mulher. Este movimento inicia-se no Reino Unido e Estados Unidos, lembrando que estes países seguiam o regime patrilinear e assim levando as mulheres a se revoltarem com a dependência imposta da mulher ao homem, dos matrimônios arranjados, o que faziam da mulher um objeto de poder do homem e manipulado pelo mesmo. Este primeiro movimento foi chamado de primeira onda que durou até parte do século XX, a segunda onda deu-se do início da década de 60 até o final da década de 80, onde as mulheres destacaram as desigualdades culturais e políticas. Essa segunda onda foi marcada por criticas duras sobre o real papel da mulher na sociedade, se realmente seria para lavar, passar e procriar apenas. Não se pode deixar de salientar também que foi nesta onda que surge o termo Women’s liberation ( Liberação das mulheres) que traduz a vontade da libertação da mulher das correntes machistas, dos conceitos inferiorizadores sobre elas. A terceira onda começou no inicio da década de 90 e vai até os tempos de hoje, mais que uma continuação a terceira onda serviu para corrigir falhas da segunda onda como pensamentos que se referem ao que é papel da mulher ou não. As intelectuais defendiam que os papeis atribuídos aos gêneros é socialmente condicionado e não estabelecidos por reais diferenças entre o sexo.
No Brasil o movimento feminista surgiu com grande força, desafiando toda uma cultura conservadora e machista existente. Igualmente no USA e no Reino Unido o movimento feminista começou no século XIX, alcançando o seu ápice no ano de 1922 quando Nísia Floresta e Berta Lutz fundaram a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, que lutava pelo direito ao voto e pelo direito ao trabalho sem autorização do marido. A repercussão da luta pelo direito ao voto levou a varias mulheres a buscarem seus direitos na constituição causando grande impacto na sociedade e ao mesmo tempo uma pressão que levou em 1933 a elaboração do código eleitoral que estendia o direito a voto à mulher e em 1934 a mulher teve sua primeira representante política do sexo feminino. O foco do movimento feminista no Brasil não foi apenas político, mas também artístico-cultural onde já surgiam mulheres a escrever livros, jornais, revistas e assim disseminando mais ainda o movimento.
Atualmente, é inegável o avanço conseguido pela mulher, o lugar alcançado por ela, mas também é inegável que ainda existe uma longa caminhada. No Brasil de uns anos para cá, o movimento feminista mudou seu foco para a proteção da mulher, uma das provas disto é a lei Maria da Penha que visa à proteção da mulher contra violência doméstica. Números indicam que só no ano de 2006 houve 20595 queixas de violência doméstica contra a mulher, este número é ainda subestimado, pois na maioria dos casos a mulher não tem coragem de denunciar o parceiro por medo de retaliações.
A mídia vem contribuindo muito para a maior conscientização das mulheres sobre a importância de fazer a denúncia, as delegacias de polícia por sua vez, estão cada vez mais voltadas para estes casos e em muita das vezes disponibilizam delegadas mulheres para deixar a vítima mais à vontade e incentivar à continuação do processo. Mesmo com a iniciativa das delegacias de crimes contra a mulher e das leis, ainda existe muita impunidade e esta mesma impunidade já causou inúmeras mortes de mulheres por seus companheiros. Isso nos leva a crer na necessidade de medidas mais concretas e de leis mais severas para impossibilitar o agressor de ao menos pensar em agredir uma mulher.
Quanto ao espaço da mulher e a caminhada para a igualdade de gênero nós vemos que é apenas uma questão de tempo e de maior conscientização, esta que deveria começar no ensino básico ao ensinar as crianças que não há sexo frágil e que as diferenças biológicas entre homens e mulheres não torna um sexo melhor que o outro, mas torna um sexo mais hábil a fazer certa atividade que é de sua natureza mais fácil. E é isso que falta entender na sociedade, que as diferenças fazem com que os sexos sejam bons em determinados afazeres e que não é necessário a mulher se tornar uma trabalhadora que usa a força e o homem um dono de casa para entendermos a igualdade, necessário é entender o poder que essas pequenas diferenças têm no mundo.

*Texto extraído do site NerdPlus de minha autoria

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